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com a opinião dos leitores deste site

Jorge Sampaio (Presidente da República - 2004)

 

Felicito a Escola 2/3 de Colos, de Odemira, pela iniciativa em curso para assinalar os 30 anos do 25 de Abril de 1974.

 “A canção de intervenção de Luís Cília, cuja obra é objecto da exposição Tributo”, constitui um significativo património da nossa cultura, da nossa história e da liberdade alcançada. Foi a voz de cantores e poetas erguida contra a opressão, a guerra colonial e a injustiça que antecipou Abril. Luís Cília, músico notável e lutador pela Liberdade, bem merece ser homenageado nesta data de tão grande significado. Por isso, saúdo esta feliz iniciativa, associando-me a ela.

 

Jorge Sampaio

 

 

José Mário Branco (Cantautor)

Abril.2004

Quando cheguei, exilado, a Paris em 1963, já lá vivia e cantava o Luís Cília. Por essa altura (ou mesmo antes?) me lembro de ouvir o que foi, salvo erro, o seu primeiro álbum na célebre editora "Chant du Monde". Do seu contacto estreito, em Lisboa, com o poeta Daniel Filipe - o da "Invenção do amor" - nasceu o seu estilo pessoal de musicar poesia editada, estilo que marcou fortemente o então chamado movimento dos "baladeiros".

Se bem que tenhamos tido diferentes olhares sobre a oficina das canções, e por vezes até divergências, o certo é que o Luís Cília foi um autor e intérprete incortornável do canto de resistência antifascista e anticolonial. É sem dúvida um "histórico" da música popular portuguesa.

Também é de realçar o seu longo e aturado trabalho de aprendizagem musical, sobretudo de composição, coisa que era (e ainda é) pouco comum nos meios da música popular. E também o excelente relacionamento que, nesse período de Paris, até 74, foi mantendo com nomes importantes da canção e da música,como Paco Ibañez, Georges Brassens, Quarteto Cedron, etc.

Voltámos para Portugal no mesmo avião, em 30 de Abril de 1974. Aterramos juntos em Lisboa ao princípio da tarde dessa terça-feira. À porta do aeroporto, cantamos juntos a "Grândola Vila Morena", na companhia de um povo livre e feliz, e de amigos como José Afonso, Adriano, José Jorge Letria, José Carlos Ary dos Santos e muitos outros.

O Luis remeteu-se, há muitos anos, ao labor mais discreto de compositor e produtor. Mas é uma referência importante quando se tenta perceber o papel dos cantautores na mudança histórica deste país.

 

 José Mário Branco

 

Urbano Tavares Rodrigues (Escritor)

 

                                                         Um abraço para Luis Cília

 

Luís Cília é mais do que um mago da canção de resistência, é um dos grandes valores da música portuguesa de ontem e de hoje.

Com raízes em Angola, onde passou parte da sua infância, a sua aversão à guerra colonial e as suas tenazes convicções antifascistas levaram-no, muito jovem, a buscar asilo em França.

Conheci bem a pequena casa em que ele vivia, em Paris, na rua de Richelieu, num exíguo sexto andar sem elevador. Mas a estuante mocidade, o ardor de muitos sonhos davam-lhe asas e à sua guitarra plangente, que ecoava a dor e a humilhação de um povo sujeito à ditadura hipócrita de Salazar e às tropelias cruéis da PIDE, em país de silêncio e de miséria.

Luís Cília cantou, com a sua voz inconfundível, poetas portugueses e poetas africanos e, quando chegou o Maio de 68, andou pelos anfiteatros dos estudantes rebeldes e pelas fábricas em greve, cantando as suas canções, ao lado de Paco Ibañez, seu companheiro de muitas lides e lutas pela liberdade, e de outros artistas franceses e portugueses.

Fomos e somos verdadeiramente amigos. O Luís Cília até musicou um poema meu, com a frescura e a força do seu talento.

Quer na música de fundo para filmes, como O Salto, que lhe deve boa parte da sua beleza, quer noutras longas composições, que tive o privilégio de ouvir em Lisboa, em salas de espectáculo e no seu apartamento, há marcas de uma sensibilidade profundamente original e de uma rara cultura musical.

Luís Cília é um autêntico criador, dominado, visionário por vezes, senhor de variados registos melódicos e intensamente português em todas as suas obras.

Foi durante muitos anos, com total empenho, militante comunista e o hino Avante, Camarada, da sua autoria, testemunha bem, no esplendor das suas notas, a entrega sincera de quem o escreveu.

Não podia, por todas estas razões e muitas mais, deixar de estar hoje aqui presente, através destas palavras, a dizer ao Luís Cília: “ Orgulho-me de ti, Amigo, e envio-te um abraço fraternal”.

                                                                                                                                         

 Urbano Tavares Rodrigues

 Memória

(Para o Luís Cília)

 

É longa a estrada amigo

cercada de ardis e decepções

Caminhos discretos

rebentam em labaredas cor do medo

à nossa volta

O vento arranha as pedras

da cidade virtual

que já foi nossa

Mas até as pedras amigo

conservam memória

daquelas velas vermelhas

dos nossos desfiles intermináveis

São crânios pesados

de sonho

que as vegetações daninhas

não conseguem poluir

enquanto o império do bem

ou do mal

tenta fazer ajoelhar o mundo

Aperta entretanto

a minha mão amigo

 

Urbano Tavares Rodrigues

 

José Casanova  (elemento do PCP)

 

No tempo opressivo e repressivo do fascismo, a voz e as canções – belas, muito belas - do Luís Cília foram focos de resistência à ditadura.

Guardarei para sempre, na memória, aquele LP Chant du Monde vindo de Paris, carregado de esperança e de força resistente, como que espalhando sementes de cravos de Abril.

É com imenso prazer que me associo à vossa homenagem a Luís Cília, neste ano de 30º aniversário do 25 de Abril.

                                                                                                                                                                                                José Casanova

 

 

Pedro Caldeira Cabral (Músico)      LUIS CÍLIA “Memórias de um caminho e outras”


Em 1968, um pequeno grupo de estudantes, de que faziam parte entre outros os saudosos amigos cantores José Labaredas,  Denis Cintra, António Macedo , reunia num  apartamento do bairro do Rego para escutar “música proibida”, constituida sobretudo pelas “baladas”do Zeca e do Luís Cília, intercalada pela produção francesa do Brassens, do Ferré, bem como pela dos espanhóis Joaquim Diaz e Paco Ibañez.Os únicos que conhecíamos, na altura..

Claro que nestas sessões memoráveis, não faltava nunca a presença do tango de Piazzola e, ocasionalmente, a nova música de Pierre Henry, Boulez, Stockhausen e Peixinho.

Foi assim que conheci a voz de Luis Cília, envolta numa atmosfera de segredo e transgressão e partilhada na discussão  dos grandes temas da época: A guerra colonial e as hipóteses de mudança do regime após a “queda” de Salazar. Em 1975, conheci pessoalmente o Luis na Universidade Nova de Lisboa, frequentando ambos o curso de Musicologia Contemporânea, nascendo aí o convite para o acompanhar numa série de concertos e gravações em países como a Finlandia, a Bulgária, a RDA,a França, etc.

O nome de Luis Cília tinha um reconhecimento internacional em várias frentes do movimento da canção de intervenção e a Revolução dos Cravos colhia também a simpatia de um número alargado de organizações empenhadas na divulgação da música(quase desconhecida)  que se fazia em Portugal.

Da colaboração com o Luis, recordo a preocupação com o rigor nas apresentações, da qualidade do som e da presença cénica, da capacidade de comunicação sem concessões à demagogia do discurso pseudorevolucinário, então predominante noutros oficiais do mesmo ofício…

Recordo e enalteço também a generosidade e a capacidade de partilha com que Luis Cília recebia os que vinham ter consigo., amigos ou apenas conhecidos, admiradores e por vezes até, simples oportunistas.

A importância do contributo de Luis Cília como cantor, guitarrista, compositor ou arranjador, só será devidamente reconhecida e apreciada quando se fizerem estudos sérios, comparados, da restante produção musical da segunda metade do século XX.

Pelo meu lado, conservo além da amizade e admiração antigas, a colaboração ocasional em projectos musicais e a partilha de objectivos artísticos de elevada qualidade.

É pois com grande alegria, que me junto a vós nesta justa homenagem!
Um abraço, com a amizade fraterna do

 

Pedro Caldeira Cabral

 

 

 

Manuel Alegre (Poeta)

 

À hora em que te for lida esta mensagem, estarei em Montemor-o-Novo por causa do meu livro Rafael, onde curiosamente, uma personagem, por sinal um cantor chamado Carlos Gil, me lembra o mesmo Luís Cília que, por vezes em Paris, me cortava o cabelo. Eu lia-lhe uns poemas, ele interrompia o corte, pegava na viola e como que por artes mágicas transformava de repente os poemas em canções. Depois as canções eram armas. Chegavam a Portugal, eram retomadas pelo Adriano e pelo Zeca ou pelo Manuel Freire, que deve estar aí, mais careca mas com a mesma voz. Eram  canções, eram proibidas, mas ficavam dentro das pessoas.

Recordo  também o teu disco nos Chants du Monde que levou pela Europa fora os ecos das nossas lutas e das nossas dores.

Recordo ainda “Portugal resiste”, eu escrevi as palavras e tu fizeste delas um hino da resistência.

Mas quero aqui assinalar sobretudo a tua exigência como artista e a tua coerência como homem e cidadão. Soubeste crescer e amadurecer com discrição, sem pirotecnias desnecessárias, fiel aos teus valores de sempre, mas com um rigor artístico cada vez mais exigente e intransigente.

E principalmente quero abraçar o companheiro generoso, homem de partilha, que através da música e poesia foi semeando Abril antes de Abril.

De todos foste talvez o mais discreto.

Mas poucos contribuíram tanto como tu para a dignificação e renovação da música ligeira portuguesa. Foste a tua própria voz e foste a voz de todos nós.

 

Manuel Alegre

 

Tino Flores  (Cantautor)

 

O Luís Cília, cantor, compositor, actor no palco e na vida e no caminho partilhado, à procura da liberdade e fraternidade, seiva do crescimento da humanidade foi assumidamente um homem que ajudou Abril e por tudo isto merece fazer parte da nossa história individual e sobretudo  colectiva.

 

Tino Flores

 

 

Alfredo Vieira de Sousa (Músico)

 

O Luís Cília começou por ser para mim o mais proibido, o mais clandestino dos nomes dos cantores portugueses. Como se fora uma palavra escrita num muro da cidade na calada da noite. Como a palavra “liberdade” ou a palavra “paz”.

Mais tarde, bastante mais tarde, havia de ver a palavra “liberdade” ou, mais verdadeiramente, a palavra “cília” no quadro da Maria Helena Vieira da Silva, que o Luís com justo orgulho exibe numa das belas paredes da sua casa.

A primeira vez que o vi próximo de mim foi na manifestação do 1º de Maio de 1974. Disse-lhe “olá Luis Cília”, como certamente dezenas ou centenas de outras pessoas tão anónimas quanto eu.

 Depois fomo-nos encontrando aqui e ali, em cima de palcos e nos bastidores e nas reuniões do Partido onde ambos militámos (com acento no “a”-  passado perfeito, não presente do indicativo).

Eu podia tentar alinhar razões pelas quais sou amigo do Luís há cerca de 30 anos. E muitas haveria de poder nomear.

Mas a amizade, como todos os afectos, não se explica, vive-se.

Nem sempre estive, nem sempre estou, nem sempre hei-de estar de acordo com o Luís. Temos gostos em comum, mas divergimos em muitos outros.

A nossa amizade nunca foi um ritual de pancadinhas nas costas e ambos temos o terrível defeito da frontalidade.

E, todavia, somos amigos sinceros há cerca de 30 anos.

Habituei-me a ver o Luís como um homem rigoroso e exigente com o seu trabalho. Ou, se quiserem, como um profissional. Mesmo no tempo,  e tempos houve, em que era politicamente incorrecto, quase “proibido”,  ser profissional no meio onde nos movíamos, porque todos estavam/estávamos  ao serviço da classe operária e do povo trabalhador e só a um “burguês” poderia passar pela cabeça ganhar dinheiro com as cantigas.

Contra quase todos o Luís exigia o direito de viver do seu trabalho.

E esta ideia, tão simples e tão justa, valeu-lhe críticas e má-vontades de companheiros e camaradas.

Como hoje é tudo tão diferente!

 

O Luís Cília nunca abastardou o seu trabalho em busca de palminhas ou de aplausos. Seguiu sempre o caminho que lhe pareceu melhor.

O Luís pode não ter nas paredes da sua casa discos de ouro e de platina, mas poderia tê-las seguramente pejadas de diplomas de honra, de respeito e de admiração que poderiam ser passados por todas as pessoas de boa-fé que conhecem o seu trabalho, o seu sentido de dignidade, a qualidade da sua obra  e o seu modo de viver a vida.

 

Ainda vamos poder ler o nome Luís Cília nos “créditos” de muitas obras que ele irá compor: de filmes, de peças de teatro, de bailados e de músicas outras.

Assim espero e confio, para bem do Luís e da música portuguesa e para nosso gáudio.

Mas, ainda que assim não fosse, o que apenas a benefício do raciocínio admito, o Luís é, por tudo o que já fez, um nome grande entre os grandes com lugar cativo  na história da canção em Portugal.

Por mais que os refazedores da História o possam omitir e  tentem apagá-lo da fotografia, o Luís está lá, por mérito próprio.

 Tenho muito orgulho em poder contar com o Luís Cília entre os meus amigos mais chegados.

 

Abril 2004                                                                                                      

Alfredo Vieira de Sousa

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